A justiça contra o caos e não a favor da ordem.
Edward Palmer Thompson, historiador britânico da concepção teórica
marxista, nasceu em Oxford no dia 3 de
fevereiro de 1924 e falecido em Worcester, 28
de agosto de 1993. É considerado por muitos como o maior
historiador inglês do século
XX.
Lutou contra o governo fascista de Benito Mussolini na Itália durante a
Segunda Guerra Mundial, chegando a sargento num regimento de tanques britânicos na Campanha da Itália. Estuda no colégio Corpus Christi
(Cambridge), onde adere ao Partido Comunista Britânico. Em 1946 formou um grupo de estudos históricos
marxistas junto com Christopher
Hill, Eric
Hobsbawm, Perry
Anderson, Rodney Hilton, Dona Torr, dentre outros.
Lecionou na
Universidade de Leeds em curso não acadêmicos dirigidos aos trabalhadores. Foi
professor da Universidade de Warwick de 1965 a 1971. Nos anos de 1970 lecionou
esporadicamente em universidade estadunidenses como de Pittsburg, Rugers, Brown
e Dartmouth College.
Thompson, um
dos maiores historiadores que pude ler, nesta minha curta formação, com esta
importante obra “Senhores e Caçadores”, tem como abordagem fundamental analisar
a questão de uma lei na Inglaterra do século XVIII[1],
mas sem deixar variadas questões da sociedade inglesa, desta época, lhe passar
em branco. Com a aprovação desta Lei em maio de 1723, que ficou conhecida como
“A lei Negra”, se instituiu mais de cinqüenta delitos capitais, todos passiveis
de pena.
Essa Lei
surgiu com o objetivo, ou o pretexto, de proteger as florestas e os bosques
ingleses dos “caçadores clandestinos” e evitar desordens sociais que vinham
ocorrendo especialmente nas regiões em torno da floresta de Windsor e
Hampshire. Há que se ter cuidado com a ilegalidade presumida destes tais
caçadores, pois muito muitos caçavam os animais e derrubavam árvores para o uso
de suas famílias e sustento, logo nota-se que o livro trata de algo além do
simples embate de contraventores e oficiais da lei, mas de um eventual problema
social que os menos favorecidos poderiam estar passando, contudo o problema foi
se agravando devido a criação de bandos armados de ladrões, que formavam uma
espécie de milícias e intimidavam os populares e coagiram os seus
administradores.
Sabendo destes
contraventores de periculosidade mais aguda, os juristas se moveram para
integrar um conjunto de leis voltadas para os chamados “Negros”, que assim
foram denominados devido camuflagens e disfarces que os mesmos utilizavam para
encobrir suas faces a fim de evitar sua identificação por eventuais testemunhas,
isto é, a denominação “Negros” não implicava de forma alguma com a cor da pele
dos indivíduos. Sendo assim, a utilização de qualquer disfarce ou formas de dificultarem
suas identidades lhes colocavam diretamente no foco da tal Lei Negra.
Conforme
relata Thompson, o “principal conjunto de infrações era a caça, ferimento ou
roubo de gamos ou veados, e a caça ou pesca clandestina de coelhos, lebres e
peixes.”[2]
Todas estas infrações eram passivas de morte caso os infratores estivessem
armados e disfarçados e caso os delitos fossem cometidos em qualquer floresta
real, o crime era ainda mais grave, não importando se o transgressor estivesse
portando qualquer tipo de arma.
Mas não era só
isso, existiam também diferentes interesses neste cenário político social. Não
eram apenas aos proprietários que se interessavam pela chamada “Lei Negra”.
Podemos ver o autor progredir a passos firmes em seu trabalho de pesquisa no decorrer
de poucos mais de 400 paginas deste livro que existia naquela época todo um “modus
operandi”, toda uma política não oficial, que cuidava ou ao menos
deveria cuidar da parte administrativa das florestas. Contudo os seus
administradores, que eram em sua grande maioria homens de prestígio e de alguma
influência política e social, em vez de usarem as terras para o beneficio da
comunidade, as utilizavam como suas ferramentas de poder para beneficio
próprio. Sendo assim, estes nobres detentores do poder administrativo se
regozijaram com uma lei que lhes dava respaldo tão abrangente e importante, dando-lhes
garantias administrativas destas terras de sua responsabilidade.
Sendo assim, a
lei veio como um martelo nas mãos destes proprietários de terras, que agora
possuíam meios legais para coibir perturbações, furtos e quaisquer problemas
que poderiam ocorrer em suas jurisdições. Sabendo que estes proprietários em
sua maioria eram fidalgos ou outros membros da nobreza que por sua vez se
encarregavam de cuidar das terras não comunais e agora com força jurídica
detinham maior poder para procurar, julgar e punir os infratores, sendo assim, a
Lei Negra trouxe uma arma contundente para as mãos destes “latifundiários”[3]
que também eram responsáveis pela segurança das famílias que ocupavam estas
áreas.
Contudo a lei
nem sempre garantia o auxilio do braço armado da Realeza e isto se torna em
muitos casos um problema grave, afinal, como manter a ordem se as autoridades
locais não dispunham de forças armadas necessária para enfrentar milícias cada
vez maiores e bem armadas? O autor relata momentos que os administradores
tiveram de lidar com tais situações e o seu desenrolar.
A obra de
Thompson proporciona um excelente exemplo da formação da noção moderna de
propriedade. Thompson ainda verifica, através desse caso concreto, a mudança de
direitos e o papel desempenhado pela nova ordem legal e pelo próprio Estado na
defesa de interesses particulares, mostrando uma virada social para interesses
individualistas.
Quanto ao
exercício da lei, posso dizer que não só foi muito utilizada como também produziu
uma série de jurisprudências que podem ser achadas mesmo depois do período da
vigência. A Lei Negra foi anulada em 1823, cem anos depois
de sua aprovação em 1723, mas os resquícios de sua aplicação após sua anulação
são achados e citados pelo autor, mostrando o quanto a Lei Negra integrou e
fundamentou a legislação inglesa depois de sua criação.
Sendo assim
posso concluir lhes dizendo que a fundamentação da Lei Negra formou as bases para
toda a legislação vigente na Inglaterra mesmo após seu fim. As afirmações dos
direitos de propriedade privada se enraizaram e se afirmaram com o apoio dos
legisladores e poderosos e contando com o apoio dos menos favorecidos, mesmo
porque, estes não gostavam de serem vitimas de aliciamentos ou de chantagens
por partes dos caçadores ilegais.
Na obra de
Thompson, conforme observado, a descontinuidade das concepções de pertencimento
é bem observada. Um novo direito de propriedade que surge com muita força,
apoiado pelas forças da burguesia emergente e tutelado pelo moderno direito
monista e estatal, sufocando inúmeras outras formas de relação de sobrevivência
entre aquelas pessoas e suas florestas.
Contudo é certo que a justiça se estrutura de
forma muito diferente que se vinha tendo anteriormente. Os juristas com novos
desafios e os senhores com novas ferramentas jurídicas para manter a ordem em
suas terras.
[1]
DEVEMOS observar que o autor vai muito além do estudo histórico da lei negra e
de suas composições. Edward Thompson realiza por meio de reconstruções de
vários acontecimentos que marca o percurso da lei Negra e analisa a
representatividade destas ações por todo século XVIII.
Ia soltar um "Earrrrch, Marxista!!!!", mas ai, ví o post anterior com o Texto do Delumeau e, isso, te salvou...hahaha
ResponderExcluirSe bem, que dos Marxistas, o Thompson é um daqueles que eu considero legível...=P
Qual o problema com os Marxista?
Excluirhahaah. Eu não "defendo" corrente nenhuma, não que eu tenha a pretensão de ser imparcial, mas pelo fato de tentar analisar a obra pela obra.
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